sábado, 2 de junho de 2012

Ausência... Vinícius de Moraes

Eu deixarei que morra em mim o desejo 
de amar os seus olhos que são doces 
Porque nada te poderei dar 

senão a mágoa de me veres exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa 


como a luz e a vida

E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto 


e em minha voz a tua voz.

Não te quero ter pois em meu ser


 tudo estaria terminado.

Quero só que surjas em mim 


como a fé nos desesperados

Para que eu possa levar uma gota de orvalho 


nesta terra amaldiçoada

Que ficou em minha carne 

como nódoa do passado.
Eu deixarei... 


Tu irás e encostarás a tua face em outra face.

Teus dedos enlaçarão outros dedos 


e tu desabrocharás para a madrugada.

Mas tu não saberás que quem te colheu fui EU, 


porque eu fui o grande íntimo da noite.

Porque eu encostei minha face na face da noite


 e ouvi a tua fala amorosa.

Porque os meus dedos enlaçaram 


os dedos da névoa suspensos no espaço.

E eu trouxe até mim a misteriosa 


essência do teu abandono desordenado.

EU FICAREI SÓ 

como os veleiros nos portos silenciosos. 
Mas EU te possuirei mais que ninguém 

porque poderei partir...

E todas as lamentações do mar, do vento, 


do céu, das aves, das estrelas.

Serão a tua voz presente, 

a tua voz ausente, 
a tua voz serenizada...

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