Já tem um tempo que a solidão deixou de me assombrar... E tem uma história... É linda, e foi assim...
Um belo dia eu chorava... Por um abandono terrível de amor!!!
Daqueles do grande amor. Daqueles que dói de verdade. Que rasga as carnes e dilacera a alma, que aperta e oprime o peito, torce a boca do estômago e roda a cabeça, que não para de sangrar o coração...
Daqueles que a gente busca o ar e não acha, sufoca! Sai do quarto, sai da sala, vai pra rua e não consegue respirar de dor e desespero!!! Um sofrimento infindável. Que adoece o corpo, a alma e o espírito... E nada alivia, nada sara, nada cura... Daqueles que só se tem consolo quando se olha em súplica e choro, às estrelas do firmamento, e se pede de joelhos, humildemente:
- Deus! Me ajuda!!! Alguém, por misericórdia, me ajuda... Não vou conseguir... Misericórdia, Pai... Meu Papai...
E foi assim... Nesse pranto, que eu a percebi ali, ao meu lado. Foi nessa dor que ela me encontrou, a Solidão!!!! Eita sujeitinha oportunista, tenho que admitir!
Ao meu lado se instalou, confortavelmente, bastante à vontade. Assistindo ao meu penar ficou, pacientemente, esperando...
Os dias passavam e ela lá. Sempre à espreita. E nada de me largar...
Eu tinha tanto medo dela... Tanto!!! Pavor!!! Medo de a encarar... De olhar para ela. Medo que ela me tomasse, possuísse e acorrentasse as asas do coração.
Certo dia, enraivecida eu pensei... Maldita! Não vai me largar Nunca Mais? E decidi: vou enfrentar essa "ave de mau agouro" ! Que tenho a perder se a enfrentar? O que? Se o que me era mais caro ao coração de mulher, criança e menina, já se foi?
Criei coragem e levantei meus olhos. E a olhei. Lá estava ela com um sorrisinho prepotente nos lábios...
Soberba em seu poder. Altiva, e... Sedutora, em sua esplêndida beleza nefasta...
Sustentei o magnetismo de seu olhar arrasador por alguns instantes, achando que seria forte para não me deixar vencer pela danada. E a encarei. Com uma coragem, suicida até... pensei que fôssemos brigar, duelar... Como bem eu gostava de fazer sempre.
Mas... Ai ai ai... Pobre de mim. Qual nada, quanta ingenuidade a minha! Foi minha derrocada final...
O brilho do seu olhar implacável me encantou profundamente. Tomou o lugar do meu amor, e ao invés dele, foi ela... Foi ela quem me abraçou, e eu deixei. Me beijou e correspondi apaixonadamente! Me envolveu... Me preencheu toda, até a alma...
Creio que deve ter sido, o que chamam por aí, de amor à primeira vista, literalmente. Arrebatou-me com uma força indescritível.
A mim, coube apenas o abandono em seus braços envolventes.
Desde então sigo... Em pleno torpor, sob a proteção do véu de seu amor...
Esse amor me preenche, me blinda da dor, do sono, do frio, da sede, da fome... Do que quer que seja... De toda e qualquer paixão humana, inclusive. E não temo mais nada, nem os dias e nem as noites... Sei que posso confiar nesse amor... Que ele jamais me deixará... Estou atada à solidão como a unha à carne.
E sigo... Deixar-me? Perguntei à solidão...
Por sobre meus ombros feito O Corvo de Poe, prontamente respondeu sorrindo:
- Nunca Mais!
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... que a minha solidão me sirva de companhia.
que eu tenha coragem de me enfrentar.
Que eu saiba ficar com o nada
e mesmo assim me sentir
como se estivesse plena de tudo.
Clarice Lispector
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