...Mas voltemos a hoje. Porque, como se sabe, hoje é hoje. Não estão me entendendo e eu ouço escuro que estão rindo de mim em risos rápidos e ríspidos de velhos. E ouço passos cadenciados na rua. Tenho um arrepio de medo. Ainda bem que o que eu vou escrever já deve estar na certa de algum modo escrito em mim. Tenho é que me copiar com uma delicadeza de borboleta branca. Essa idéia de borboleta branca vem de que, se a moça vier a casar, casar-se-á magra e leve, e, como uma virgem, de branco. Ou não se casará? O fato é que tenho nas minhas mãos um destino e no entanto não me sinto com o poder de livremente inventar: sigo uma oculta linha fatal. Sou obrigada a procurar uma verdade que me ultrapassa. Por que escrevo sobre uma jovem que nem pobreza enfeitada tem? Talvez porque nela haja um recolhimento e também porque na pobreza de corpo e espírito eu toco na santidade, eu quero sentir o sopro do meu além. Para ser mais do que eu, pois tão pouco sou.
Lispector, Clarice, 1925-
2 comentários:
Da Macabéa que existe em todas nós... rsrs
Lindo...
Beijo a todas(os) que têm alma e coração de "mulher"!!!
;D
Sábado de sol a todosss...
Amei!
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